
Legenda: Flamengo é campeão pela nona vez no Brasileiro Foto Gilvan de Souza Flamengo
O Campeonato Brasileiro de 2025 marca um divisor de águas na economia do futebol nacional. Em apenas dois anos, as casas de apostas se tornaram as principais financiadoras dos clubes da Série A, movimentando cifras nunca antes vistas no país.
Um levantamento da agência Jambo Sport Business revela a dimensão dessa transformação: os patrocínios master (aqueles estampados no centro do peito dos uniformes) saltaram de R$ 496 milhões em 2023 para R$ 1,117 bilhão em 2025.
O aumento de 125% consolidou as chamadas bets como protagonistas absolutas do cenário esportivo brasileiro, ultrapassando a marca de R$ 1 bilhão e deslocando para segundo plano empresas tradicionais de consumo, bancos e estatais.
A era das bets: 18 dos 20 clubes dependem do setor
O domínio é quase total. Dos 20 clubes da elite do futebol nacional, 18 exibem uma casa de apostas como patrocinadora principal, representando 90% dos times.
Os únicos dois que não estampam uma bet no espaço máster, Bragantino e Mirassol, mantêm acordos com empresas do setor em outras partes dos uniformes, reforçando que a presença das apostas é praticamente onipresente.
Esse cenário é resultado de uma disputa intensa entre as marcas por visibilidade. Em um mercado onde os serviços são muito semelhantes entre si, a exposição constante nas camisas funciona como principal diferenciação. Como definem analistas, “bets são commodities”: oferecem o mesmo produto, e a publicidade se torna a arena decisória para atrair o público.
Por que as bets investem tanto? A lógica por trás dos bilhões
Há três fatores centrais que explicam o poder de fogo dessas empresas:
1. Estrutura operacional mais leve
Ao contrário de indústrias tradicionais, as casas de apostas não lidam com produção, estoque ou logística. Com custos fixos reduzidos, grande parte do orçamento pode ser direcionada para duas áreas estratégicas: marketing massivo e tecnologia.
2. Lucros elevados
O setor tem margens robustas, especialmente em mercados emergentes como o Brasil. Isso permite que parte do lucro seja reinvestido em campanhas de grande escala.
3. Concorrência agressiva
Com dezenas de empresas disputando o mesmo público, o patrocínio a clubes de massa se tornou o “ponto alto” da visibilidade. Estar no peito de Flamengo, Corinthians ou Palmeiras é garantir reconhecimento instantâneo e confiabilidade aos olhos do torcedor.
O resultado? Uma supervalorização desse espaço. Há casas de apostas desembolsando quase R$ 300 milhões por ano por um único clube, valores simplesmente inalcançáveis para a maioria dos setores tradicionais.
Quando o jogo muda: por que outras empresas saíram do patrocínio master
O efeito colateral foi imediato: bancos, farmacêuticas, marcas alimentícias e até estatais perderam espaço.
A inflação dos preços afastou empresas que antes eram presença constante nas camisas. Em alguns casos, o valor cobrado por um clube da Série A corresponde ao orçamento anual inteiro de marketing dessas companhias, incluindo publicidade, pesquisa e ações institucionais.
Com as bets estabelecendo um novo parâmetro financeiro, o mercado se reconfigurou rapidamente. O resultado é um domínio quase absoluto do setor, algo sem precedentes no futebol brasileiro.
Enquanto a Europa restringe, o Brasil expande
O crescimento brasileiro acontece em sentido oposto ao de grandes ligas europeias.
Espanha
Proibiu em 2021 toda publicidade de apostas em clubes, incluindo uniformes e estádios.
Itália
Desde 2019, o Decreto Dignità veta propagandas de apostas em uniformes e competições.
Inglaterra
Os clubes da Premier League têm até a temporada 2025/2026 para retirar bets do patrocínio máster. Fica permitido apenas o espaço na manga.
No Brasil, o movimento é outro. Ainda que o Senado tenha aprovado um projeto de lei com novas restrições — como proibir atletas, artistas e influenciadores em campanhas — a norma preserva os patrocínios estampados nas camisas.
Analistas avaliam que uma proibição completa é improvável no curto prazo, dada a forte influência do setor no Congresso e o momento de regulamentação do mercado no país.
Paralelamente, o governo lançou a plataforma nacional de autoexclusão, prevista para entrar em operação em 10 de dezembro, como parte da estratégia de jogo responsável.
Flamengo puxa a fila com contrato recorde: R$ 268 milhões
No topo da lista, o Flamengo lidera com folga. Após fechar novo acordo com a Betano, o clube passou de R$ 85 milhões em 2023 para R$ 268 milhões em 2025, um crescimento de 215%, o maior valor já pago a um clube brasileiro.
Outros gigantes também surfam a onda:
Palmeiras: deixou a Crefisa após 10 anos e assinou com a SportingBet (R$ 100 milhões).
Botafogo: firmou o maior contrato de sua história com a Vbet (R$ 55 milhões).
Atlético-MG: acordo com a H2Bet pode superar R$ 200 milhões no total.
São Paulo: subiu de R$ 24 milhões para R$ 78 milhões com a Superbet.
Vasco: firmou parceria com a Betfair por R$ 70 milhões.
A seguir, os valores consolidados das equipes da Série A em 2025:
Clube | Patrocinador Máster | Valor (R$ mi) |
Flamengo | Betano | 268 |
Corinthians | Esportes da Sorte | 103 |
Palmeiras | SportingBet | 100 |
São Paulo | Superbet | 78 |
Vasco | Betfair | 70 |
Atlético-MG | H2Bet | 60 |
Santos | Blaze | 55 |
Botafogo | Vbet | 55 |
Fluminense | Superbet | 52 |
Grêmio | Alfa | 50 |
Internacional | Alfa | 50 |
Cruzeiro | Betfair | 42 |
Bahia | Viva Sorte .bet | 40 |
Fortaleza | Cassino | 30 |
Vitória | Bet7k | 22 |
Juventude | Stake | 20 |
Ceará | Esportes da Sorte | 17.3 |
Athletico-PR | Viva Sorte .bet | 17 |
Um futuro bilionário (e incerto)
O domínio das casas de apostas no Brasil parece longe do fim. Com regulamentação, margens altas e um mercado consumidor em expansão, o investimento tende a crescer, pelo menos no curto prazo.
Ao mesmo tempo, o setor vive sob observação, seja por preocupações de saúde pública, seja pela comparação com países que já adotaram restrições severas.
O que parece certo é que, em 2025, o futebol brasileiro nunca dependeu tanto do dinheiro das bets. E essa relação, bilionária e estratégica, deve continuar moldando o esporte dentro e fora de campo em 2026.



